Mãe Caçulinha
Mulher negra, mãe de santo e Amor de uma comunidade
Mãe Caçulinha, cujo nome de nascimento era Carlita, nasceu em Campos dos Goitacazes, interior do Rio de Janeiro, no dia 7 de outubro de 1927. Sua jornada espiritual é marcada por um chamado divino que a conectou aos orixás ainda muito jovem, conduzindo-a a se tornar uma das figuras mais importantes e respeitadas dentro do Candomblé de tradição Angola.
De uma família de origem católica e com uma educação ocidentalizada, Mãe Caçulinha teve sua vida transformada quando começou a experienciar manifestações espirituais, ainda sem compreensão plena. A partir desse momento, ela seguiu seu destino, respondendo ao chamado dos orixás e dedicando-se à religião de seus ancestrais. Embora tenha nascido em um contexto distante das tradições africanas, ela se tornou um elo entre o passado ancestral e o presente, resgatando e perpetuando valores do Candomblé, um legado deixado pelos africanos trazidos como escravizados ao Brasil.
A Trajetória no Candomblé
A sua ligação com o Candomblé começou de forma inusitada e profunda. Embora nascida no Rio de Janeiro, foi em São Paulo que Mãe Caçulinha verdadeiramente mergulhou na religiosidade afro-brasileira, ao se aproximar de um Babalorixá baiano que a iniciou nas práticas do santo. Em 1966, ela fundou oficialmente o Abassá de Oxum e Oxóssi na cidade de São Paulo, um dos centros mais conhecidos de culto a Oxum e Oxóssi no Brasil. Seu terreiro se localizava na zona leste da capital paulista, na região do Cangaíba, e logo se tornou um ponto de acolhimento e orientação espiritual para muitos que buscavam ajuda.
Apesar das dificuldades enfrentadas para se estabelecer em São Paulo, incluindo a adaptação ao novo contexto urbano e os desafios de conciliar a vida familiar com a dedicação ao Candomblé, Mãe Caçulinha encontrou sua vocação no auxílio às pessoas. Ela passou a ser procurada por muitos para consultas espirituais e para o atendimento às necessidades de seus filhos e filhas-de-santo.
Como Yalorixá (sacerdotisa de Candomblé), Mãe Caçulinha dedicou sua vida ao cuidado e à orientação espiritual de seus filhos-de-santo. Ela era uma figura de sabedoria, com um profundo conhecimento dos mistérios do santo, e foi responsável por transmitir essas lições com humildade e dedicação. Sua casa de Candomblé não era apenas um espaço de culto, mas também um centro de acolhimento e ensinamento, onde o amor aos orixás e o respeito pelas tradições ancestrais eram sempre cultivados.
Mãe Caçulinha era conhecida por sua energia contagiante e pela sua simplicidade, que contrastava com sua profunda sabedoria. Ela acreditava que, embora sua visão fosse limitada pelas circunstâncias de sua vida, seus ensinamentos sobre os mistérios do santo eram suficientes para guiar e inspirar aqueles que procuravam a força dos orixás.
A Influência e Legado de Mãe Caçulinha
O legado de Mãe Caçulinha vai além de sua função de mãe-de-santo. Ela foi uma das grandes responsáveis por trazer a cultura afro-brasileira e o Candomblé a um público mais amplo, criando uma verdadeira comunidade espiritual que transcendia as fronteiras da etnia, com pessoas de diferentes origens e histórias encontrando no terreiro um lugar de acolhimento e aprendizado.
A sacerdotisa também foi reconhecida por sua articulação social e seu esforço em fortalecer os laços comunitários. Ao longo de sua vida, Mãe Caçulinha tornou-se uma verdadeira guardiana das tradições do Candomblé, realizando rituais, aconselhando, ensinando e abrindo caminho para que as novas gerações continuassem a jornada espiritual com a mesma devoção e respeito pelos orixás.
Seu trabalho não foi apenas no campo espiritual, mas também na preservação da cultura afro-brasileira, resistindo ao tempo e aos desafios, mantendo acesa a chama das tradições de seus ancestrais. Ao longo dos anos, ela inspirou muitos com suas palavras de sabedoria, gestos de generosidade e, sobretudo, com a dedicação que teve a sua missão de vida.
Sua trajetória, marcada por desafios pessoais e vitórias espirituais, foi um reflexo da força e da determinação de uma mulher que não só se dedicou ao Candomblé, mas também foi responsável por manter vivas as tradições de seus ancestrais. Como ela mesma dizia, "os mistérios do santo" eram o que ela mais poderia ensinar, e foi com esses ensinamentos que ela ajudou a formar uma geração de filhos e filhas-de-santo que hoje continuam a passar adiante sua sabedoria e amor pelos orixás.
Mãe Caçulinha faleceu deixando um legado incomparável no mundo do Candomblé, mas sua memória e suas lições continuam a ser uma luz que guia as novas gerações do Abassá de Oxum e Oxóssi, perpetuando o amor, a devoção e a força de Oxum e Oxóssi na vida de todos aqueles que cruzaram seu caminho.
Depoimentos sobre Mãe Caçulinha
Mãe Caçulinha é lembrada e reverenciada por muitos como uma grande matriarca espiritual e uma mulher de uma sabedoria ímpar, que dedicou sua vida à preservação das tradições do Candomblé e ao cuidado com sua comunidade. Os depoimentos de aqueles que a conheceram, tanto dentro quanto fora do Candomblé, refletem a importância de sua presença na vida de tantos.
D. Dirce
“Estou com Mãe Caçulinha há mais de trinta anos. Não sou adepta do candomblé, mas nunca me senti fora de lugar em sua casa. Ela sempre foi como uma mãe para mim, não apenas no santo, mas também na vida pessoal. Sua generosidade e sabedoria transcendem qualquer religião.”
Estes relatos, de pessoas próximas de Mãe Caçulinha, mostram o respeito, a afeição e a admiração que ela conquistou ao longo de sua vida. Sua casa, o Abassá Oxum Oxóssi, continua sendo um espaço de acolhimento, aprendizado e transformação, mantendo vivas as tradições que ela soube preservar com tanto amor e devoção.